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quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Engenheiros do Hawaii - "A Revolta dos Dândis" (1987)


"O disco e tudo mais é dedicado à Porto Alegre
(a real e as imaginárias)"
dedicatória da banda no encarte do álbum



Uma vez eu ouvi, não lembro onde, Humberto Gessinger, líder e cabeça pensante dos Engenheiros do Hawaii, dizendo que os discos gêmeos “A Revolta dos Dândis” e “Ouça o Que Eu Digo Não Ouça Ninguém” eram sobre comunicação. Bom, acho que é verdade e não é. Efetivamente o são com seus outdoors, comerciais, vozes oficiais, seus livros e revistas mostrando imagens sem nitidez, infelizes infartados de informação e televisões e rádios sendo jogados pelas janelas, mas junto com isso trazem também dilemas pessoais, paixões mal-resolvidas, dúvidas existenciais, conflitos ideológicos e mais uma série de outros assuntos que se não constituem um centro temático, por certo em algum momento encontram o tema que, segundo o principal compositor da banda norteia a obra. Podia aqui falar de qualquer um dos dois mas começo pelo primeiro da trilogia que só terminaria com o bom "Várias Variáveis" de 1991. Depois de um primeiro disco interessante porém com sonoridade um tanto crua e pouco definida, Os Engenheiros do Hawaii reapareciam com um disco conceitual apoiado no folk, no progressivo e na própria tradição musical gaúcha, muitíssimo bem encaixado, bem resolvido, bem concebido, e, como diz o meu amigo Christian Ordoque, colaborador daqui do ClyBlog, um disco com início-meio-fim. Com letras inteligentíssimas, bem sacadas, repleto de referências literárias, citações filosóficas, ditos populares, trocadilhos e combinações fonéticas interessantes, o álbum “Revolta dos Dândis” de 1987, era o retrato do amadurecimento da banda de Porto Alegre com um som mais robusto, ousado e agora cheio de personalidade, muito devido ao ingresso do guitarrista Augusto Licks que colaborava então de forma decisiva para este crescimento e para as melhores virtudes instrumentais do álbum.
O nome do disco, tirado de um capítulo de um romance de Albert Camus, dá nome às faixas de abertura de cada lado do que seria um LP (formato original de seu lançamento), ambas começando com o mesmo riff e apresentando formatos bastante parecidos no que diz respeito à composição com letras que expõe, de certa forma, os dois lados que tudo na vida pode ter e a procura por algum sentido nisso tudo. Aliás o disco todo se amarra e cria interligações entre uma faixa e outra: versos de “Vozes” são repetidos em “Quem Tem Pressa Não Se Interessa”; o fraseado de guitarra que abre “Terra de Gigantes” reaparece no início de “Vozes”; conceitos de “Filmes de Guerra, Canções de Amor” aparecem expressos em “Desde Aquele Dia” entre várias outras peças soltas neste pequeno quebra-cabeça.
A suave e profunda “Terra de Gigantes”, um dos grandes sucessos do disco, com seus sonhos, perguntas e anseios de juventude, tinha ares de hino de geração; “Infinita Highway” outro hit radiofônico, até improvável por sua longa duração para os padrões de rádio, trazia um pop-rock envolvente que nada mais fazia que expor a grande estrada que é a vida; a romântica “Refrão de Bolero”, flertando com o brega, era uma balada dolorida de dor-de-cotovelo ao melhor estilo do conterrâneo Lupicínio Rodrigues; e fechando o que seria o lado A, a espetacular “Filmes de Guerra, Canções de Amor”, além de uma letra genial, trazia uma brilhante percussão de tamborins durante os excelentes solos de Augusto Licks entre as partes da letra, crescendo até explodir numa verdadeira escola de samba na parte final. “Quem Tem Pressa Não Se Intereressa” tem uma certa ênfase na bateria e um vocal 'atropelado', e a boa “Desde Aquele Dia” mostrava um toque de música espanhola sobretudo no refrão. O disco acaba com a notável “Guardas da Fronteira” com participação vocal do lendário músico gaúcho Júlio Reny, e cuja sonoridade remete um pouco à música regionalista, numa canção sarcástica e pessimista que encerra praticamente toda a idéia do disco conferindo-lhe um final digno e grandioso.
“Ouça o que Eu digo Não Ouça Ninguém”, que o seguiria poderia tranquilamente ter sido o disco 2 de um álbum duplo, por exemplo, tal a semelhança e complementação de ambos os trabalhos mas como não foi, e é quase inevitável falar de um sem citar o outro, será objeto de análise em outro momento e merecerá seu capítulo à parte.

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FAIXAS:
1."A Revolta Dos Dândis I"   4:10
2. "Terra De Gigantes"   3:59
3. "Infinita Highway"   6:11
4. "Refrão De Bolero"   4:34
5. "Filmes De Guerra, Canções De Amor"   4:02
6. "A Revolta Dos Dândis II"   3:13
7. "Além Dos Outdoors"   3:33
8. "Vozes"   3:35
9. "Quem Tem Pressa Não Se Interessa" (Humberto Gessinger, Carlos Maltz) 2:27
10. "Desde Aquele Dia"   3:30
11. "Guardas Da Fronteira"   4:31


* todas as faixas, Humberto Gessinger, exceto as indicadas

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Um comentário:

  1. Um ótimo texto sobre uma grande banda,o vocalista-letrista-baixista é demais!

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